Por Thais Jansen Watanabe Xavier
O contrato de locação comercial se consubstancia em espécie essencialmente personalíssima, em que a figura do locador disponibiliza ao locatário, mediante retribuição, o uso e gozo de bem infungível por certo período de tempo.
A duração do aludido negócio jurídico, uma vez transcorrido o lapso temporal originariamente avençado, poderá ser alterada em duas ocasiões. A primeira ocorre diante de novo ajuste entre as partes. A segunda, por sua vez, dá-se quando o locador não se opõe à permanência do locatário no imóvel locado, após trinta dias do vencimento do contrato, presumindo-se a continuidade da locação nas condições outrora ajustadas, no entanto, sem prazo determinado para término.
Contudo, acaso a mantença do contrato locatício não ocorra por meio das hipóteses acima alinhavadas, a Lei 8.245/91, legislação aplicável à locação comercial, possibilita ao locatário ajuizar ação renovatória.
A citada Lei não limita a quantidade de vezes consecutivas em que a ação renovatória poderá ser ajuizada, motivo pelo qual, se o locatário é diligente ao ponto de satisfazer os requisitos objetivos indispensáveis à renovação do contrato pela via judicial, o locador permanece à mercê da perpetuidade do contrato, cuja característica se revela incompatível com o instituto locação.
Nesse sentido, uma solução para eventual litígio que envolva uma ação renovatória ajuizada em desfavor do locador, na qual este pretenda rescindir o contrato é aguardar os trinta dias necessários à configuração da locação sem prazo determinado. Após, o locador deverá distribuir, por dependência à pretensão renovatória, a ação de despejo por denúncia vazia contra o locatário, modalidade que prescinde de discussão acerca do motivo do locador sobre a retomada do imóvel, eis que independe de motivação.
Ocorre que diante do mero conflito aparente de interesses do locatário de renovar e do locador de rescindir a locação, merece prevalecer a tutela do direito inerente à propriedade do locador de retomar a posse do que é seu, em que pese o ajuizamento anterior de ação renovatória.
Isso porque, embora a Lei 8.245/91 autorize o locatário a ajuizar ação renovatória para resguardar sua prerrogativa de inerência ao ponto comercial, o legislador constituinte originário garantiu à propriedade o status de direito fundamental, a teor do que dispõe o inciso XXII do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil.
Nesse contexto, diante de provável oposição entre o interesse do locatário de permanecer no imóvel e o direito de propriedade do locador de retomá-lo, deve preponderar o segundo, em especial por sua feição constitucional.
Dessa forma, o amparo do locatário somente é razoável na hipótese em que o exercício de seu direito de renovar não tiver o condão de interferir na plenitude da propriedade do locador. Nesse sentido, a renovação do contrato será cabível, desde que esteja em estrita consonância com o interesse do locador de promover a continuidade da locação.
Vale ressaltar que a retomada do imóvel pelo locador não significa necessariamente o insucesso do empreendimento do locatário, visto que ensejará apenas a sua mudança geográfica, nada obstante seja a sua clientela comunicada por ele acerca da alteração do respectivo endereço comercial.
Ademais, o fato de o locatário eventualmente ter investido no imóvel com obras para captação de sua clientela deve ser interpretado como o instrumento utilizado para auferir lucros com o empreendimento, inclusive para adimplir a contraprestação devida ao locador.
Todavia, não deve se prestar como obstáculo para o locador retomar a posse do imóvel, justamente porque ao promover a locação o locatário tinha ciência de que a posse era precária e, portanto, passível de ser desfeita quando decorrido o lapso temporal contratado. Nessa esteira, se houve investimento vultoso no imóvel a cargo do locatário, este o realizou em flagrante risco, não podendo o locador ser onerado a renovar negócio jurídico de modo compulsório.
Portanto, considerando que não há ressalva na Lei 8.245/91 no tocante à pendência de julgamento de ação renovatória, a possibilidade de restabelecer a posse plena do imóvel pelo locador, por meio do despejo por denúncia vazia, configura proteção ao direito constitucional da propriedade. Entender de modo contrário significaria o esvaziamento dos atributos do proprietário de usar, gozar e dispor do bem que lhe pertence.